11 de outubro de 2010

Um Silêncio Covarde

CLÓVIS ROSSI

Um silêncio covarde

Brasil se cala novamente a respeito da proteção dos direitos humanos, agora no Prêmio Nobel da Paz


QUE ENSURDECEDOR -e triste- silêncio do governo brasileiro em relação à concessão do Nobel da Paz ao dissidente chinês Liu Xiaobo.

Nem precisava manifestar "grande alegria", tal como o fez, no ano passado, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva para se referir a idêntico prêmio para seu colega Barack Obama.
O Itamaraty alega que chefe de Estado premiado é uma coisa, dissidente é outra. É claro que uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa, mas parece-me muito mais digno manifestar alegria pela premiação de quem luta pelos direitos humanos do que pela do presidente de um país que estava -e continua- envolvido em duas guerras.

Para tornar ainda mais moral e eticamente inaceitável o silêncio, há o fato de que, na mensagem a Obama, Lula mencionara Martin Luther King e "sua luta pelos direitos civis". Ora, Liu também luta pelos direitos civis. Não merece idêntico respeito?

Convém lembrar também que o governo estaria obrigado até constitucionalmente a manifestar-se, posto que o artigo 4 da Constituição cita a "prevalência dos direitos humanos" entre os princípios a serem utilizados pelo Brasil em suas relações internacionais.
De que tem medo o governo Lula quando se trata de violações aos direitos humanos que envolvem ditaduras?

Os Estados Unidos mantêm com os chineses relações intensas, obtiveram deles até a aprovação das sanções ao Irã, gesto a que o Brasil se recusou.

Ainda assim, na mensagem que emitiu a propósito do Nobel para Liu, Obama ousou pedir ao governo chinês que "solte o sr. Liu o mais depressa possível".

Já o Brasil pediu ao Irã que libertasse a francesa Clotilde Reiss e, mais recentemente, uma americana, até por pedido do Departamento de Estado. Nem por isso, o Irã rompeu relações com o Brasil. Que custo teria já nem digo pedir a libertação de Liu mas, ao menos, soltar uma nota parabenizando-o?

Depois, as autoridades brasileiras resmungam quando o país é criticado por seu silêncio na questão de direitos humanos ou, pior ainda, por dar, mais de uma vez, a impressão de que apoia a repressão aos dissidentes no Irã ou em Cuba.

Crítica, de resto, feita até por acadêmicos que, no conjunto da obra, aplaudem a atuação da diplomacia brasileira.

Direitos humanos, convém repetir até a morte, não é uma questão interna de cada país. É universal.

Como pode um governo que paga indenizações a vítimas de uma ditadura - como, de resto, é justo que o faça- silenciar ante vítimas de outras ditaduras?

Apenas em nome dos negócios com a China? Não é eticamente aceitável, mas, ainda que o fosse, convém anotar cálculos de Kevin P. Gallagher, professor associado de Relações Internacionais da Boston University: para ele, 30% das exportações brasileiras de manufaturados estão sob ameaça direta da produção chinesa, pelo avanço desta nos mercados da América Latina e do Caribe, e mais 54% sob ameaça indireta, que é quando a fatia de mercado da produção latino-americana aumenta a um ritmo inferior ao da China.

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