Joinville comemora 163 anos de fundação. Aniversários supõem
avaliações. O que dizer da cidade nesta data querida? Há sempre dois olhares. O
primeiro, rosa, aplaude e vê perspectivas. O segundo, mais realista, franze a
testa com os desafios à frente. A cidade já não é a locomotiva de meio século
atrás. Ao contrário, nos últimos 30 anos reduziu a velocidade e nos últimos
governos se arrasta em trilhos colocados há duas gerações. A cidade mudou. E
muito. Não foi para melhor, apesar de fatos relevantes, dos quais o crescimento
da população é o mais visível. A qualidade de vida decaiu. Viver na cidade
ficou complicado. Quase irritante.
Num país urbanizado nas últimas cinco décadas, Joinville é uma das raras
cidades que não desfrutam de acessos duplicados e asfaltados. O trânsito é
ruim, e não existem elevados ou viadutos. As pontes, igualmente, são poucas
interligando as diferentes áreas. Neste sentido, a cidade parou há 30 anos.
Ligações como a Dona Francisca a Pirabeiraba e o acesso ao aeroporto deveriam estar
duplicadas há pelo menos 20 anos. Se estiverem prontas nos próximos dez, o
atraso continuará o mesmo: 30 anos.
Escassez de água e falta de saneamento são fatos reais na vida de milhares de
cidadãos, apesar dos “milagres” do discurso político dos últimos anos. Como diz
o prefeito Udo, a questão não é dinheiro, é competência. A Prefeitura, o maior
cabide de empregos da cidade, requer administrador capaz de abrir mão dos
cargos de confiança e cumprir promessas de campanha. Azeitar a máquina com medidas
rápidas e tirá-la do marasmo e da mediocridade. É disso que a cidade precisa. E
de lideranças afirmativas, sempre mais escassas.
Até 2030, dois terços da população do mundo se concentrarão nas cidades. Daqui
a meros 16 anos, a cidade sentirá ainda mais essa concentração, em razão do
setor industrial na região que cresce a ritmo parecido aos anos 60, época do
“milagre brasileiro”. É bom? Não é. Os problemas se agravarão, em todos os
sentidos. Os governos estão atolados na ineficiência, no empreguismo e nos
desvios de finalidade. Não há razão para entusiasmo ou para acreditar que
Joinville estará melhor em 2031, quando alcançar 180 anos. A próxima geração
estará em situação ainda difícil. Prefeitura pede competência, agilidade. E
coerência. Continuamos esperando.
“Em Joinville, o crescimento da frota de veículos coloca a cidade em congestionamentos diários, sem que haja reação do poder público. Pelo contrário, a sensação que se tem é que a cidade reza para que o próximo administrador assuma. Joinville tem mais de uma dezena de prédios interditados, ruas esburacadas, praças deterioradas, serviços públicos paralisados, a cultura rebaixada e realizações de “fachada”. Nada, contudo, que destoe do quadro geral. E lá como cá, reação não há.”
Com toda sapiência que lhe é peculiar, o articulista soube expressar, aquilo que está evidente a todos.
Gostaria de pinçar apenas uma frase, que reflete na íntegra o sentimento de todos, que assim como eu, gostam de Joinville.
“O governo premiou servidores incapazes de prosseguir com eficiência projetos empacados (os dez parques jamais concluídos, apesar de dinheiro do exterior) guindando-os a funções mais elevadas, ou de retorno a antigos postos, numa política de constrangedora desfaçatez a princípios da meritocracia”.
Em fim , o retrocesso que aconteceu - e acontece - em Joinville , levará o novo administrador, a buscar fazer tudo que deixou de ser feito por esse desgoverno.
Parafraseando o molusco “ Nunca antes da história de Joinville”, ouve um fiasco tão grande, mas nada que não esteja ruim, que não possa piorar.
Depois dessa desadministração, não dá mais para Joinvillense acreditar em “Papai Noel ou Coelhinho da Páscoa”. Os futuros pretendentes a alcaide, devem ser sabatinados por todos, e se possível, fazê-los comprometer-se com os anseios da sociedade, que no caso de Joinville , são os básicos.
Vencido o primeiro mês desde o anúncio do “pacote” de medidas do governo do PT em Joinville, encaminhamentos e reações revelam que se trata de mero factoide para desviar a atenção do principal: a impossibilidade técnica e o desastre político da não-concessão de reajuste salarial aos servidores. O resto é foguetório e encenação, menos a greve dos servidores.
Transferindo a discussão de eventual reajuste para janeiro do ano que vem, avocando medidas irrealizáveis no curto prazo, o governo continua fazendo o que sempre fez desde o início: ergue muros de explicações inconsistentes e desculpas esfarrapadas para esconder sua incapacidade de gestão. Em todas as áreas, da cultura à educação, de obras a realizações no turismo, do esporte ao sistema viário, tudo que é da Prefeitura parou e não há sinal de movimento até o final do ano que vem, quando, por certo, a remoção será definitiva. A extinção das secretarias regionais ficou para janeiro do ano que vem e depende de aprovação da Câmara. De todas as medidas anunciadas – consideradas exercício de imaginação de abençoado assessor, sem compromisso com a realidade – resta a decisão de transferir o reajuste dos servidores para 2012. Nem mesmo a extinção de 1,8 mil cargos de melhor remuneração é verdade. Explicado depois, trata-se do “não-preenchimento” de vagas existentes. Dos mais de 11 mil servidores da Prefeitura, nenhum será demitido na cota dos 1,8 mil anunciados cargos extintos.
O governo premiou servidores incapazes de prosseguir com eficiência projetos empacados (os dez parques jamais concluídos, apesar de dinheiro do exterior) guindando-os a funções mais elevadas, ou de retorno a antigos postos, numa política de constrangedora desfaçatez a princípios da meritocracia. Por falta explícita de quadros, o governo se viu obrigado a efetivar suplentes em secretarias importantes, comprovando notórias dificuldades em trazer nomes novos para a administração pública. Assim, o que era reforma virou remendo, se tanto.
Na reta de chegada, o PT revela-se de escassa produtividade e incapaz de resolver velhos problemas como a manutenção de prédios públicos, agilidade nos serviços burocráticos, conclusão de qualquer projeto e, pior, manteve inchada a folha salarial e não resolveu nada na Saúde. Assim, sem conseguir pagar fornecedores e sem condições de reajustar a folha, o governo se despede de qualquer viabilidade eleitoral. Vai se agarrar ao PMDB, entregando os anéis para salvar os dedos. Mesmo assim, o governo delira, anunciando as obras da Companhia Águas de Joinville como realizações da Prefeitura, dando a entender que a ampliação da rede de esgotos é obra da administração direta. Fora disso, não há o que anunciar ou dizer à população. Apenas repetir a lamentação de que “o governo do Estado esqueceu a cidade” e que o dinheiro da União virá, por conta de “portas abertas” que o PT daqui jamais soube onde estão. Nem em Brasília nem em qualquer outro lugar. Um fiasco, do começo ao fim, com danos e custos incalculáveis à cidade, que retrocede em tudo desde o início da gestão do PT.
Joinville vive momento delicado, enquanto discute o que fazer com a lagoa que deveria abrigar o campus da federal, como duplicar avenidas vitais sem planejamento algum, apesar de estruturas burocráticas de presidentes, diretores, executivos, gerentes e chefes disso e daquilo para a produção final de quase nada. Tudo depende de Brasília e das relações do PT, frágeis e vulneráveis como nunca antes estiveram, depois do vexame eleitoral de 2010.
O escritor e historiador joinvilense Apolinario Ternes, nos deleita uma vez mais com o seu texto inteligente, vibrante e critico. Trânsito e Peleguismo publicado no jornal A Noticia
Minha Páscoa foi tomada por muito trabalho, o que não é novidade e pela leitura do livro Tempos Modernos, de Apolinário Ternes. Como os outros livros seus que já li, é um livro facil de ler. A pesar da riqueza de informações e detalhes, a leitura flui com facilidade e não fica pesado.
Chamou-me a atenção porem uma mudança sensível com relação a livros e textos anteriores do Apolinário, o peso que deu ao impacto do planejamento urbano. Fiquei feliz com isto, muitos se não a maioria dos problemas que temos e que deveremos amargar ainda durante muito tempo, como cidade, é resultado do modelo de desenvolvimento urbano que adotamos no passado recente, transferindo para a iniciativa privada (loteadores) a responsabilidade do desenvolvimento da cidade, definindo para aonde e como a cidade cresceria. Depois o IPPUJ e as sucessivas administrações municipais que tivemos, continuaram correndo atrás, tentando tampar o sol com a peneira. Sem fazer planejamento só atendendo interesses particulares. Num modelo que continua firme e forte.
Estes anos que o livro relata, são também, os anos da formação da cidade, considerando a cidade a partir da visão urbana. Foi justamente por não ter seguido o Plano diretor de 1973 que temos muitos dos problemas que temos.
Onde ficaram as ruas e avenidas projetadas: a Almirante Jaceguay? O zoneamento previsto, para preservar as áreas de morro e as áreas verdes?A outra metade da Marques de Olinda? A sua prolongação? Os grandes eixos que moldariam a cidade e que á permitiriam crescer de forma como foi pensada em 1973, nunca sairiam do papel e a cidade não cresceu como foi projetada, depois disto só tivemos remendos e gambiarras urbanísticas.
Outro tema que o livro aborda, ainda que superficialmente ( por exemplo no capitulo dedicado JEC) e que me parece apaixonante é o do surgimento da identidade Joinvillense, a atual, a nova, esta que é resultado da miscigenação dos alemães (é um jeito de falar, sabemos que não eram só alemães) dos portugueses, italianos, paranaenses, gaúchos, paulistas, incluindo os francisquenses, sãobentenses e tantos outros e ate um que outro espanhol perdido, que por aqui aterrissou. Esta é a Joinville do Amanha, a que surgirá dos autênticos joinvillenses, sem uma etnia definida e preponderante, porem que incorporam características de todas elas e constituem o novo Joinvillense, a alguns destes eu denomino carinhosamente as vezes ( outras não tanto) os novos sambaquianos.
O ultimo livro de Apolinário Ternes, traz trechos que merecem ser lidos, como quem saboreia um bom vinho, com atenção aos detalhes.
“ A pesar do Plano Diretor de 1973, de sua revisão, modernização e adaptação em 1987 e da criação do Instituto de Pesquisa e Planejamento em 1989, a prefeitura da maior cidade de Santa Catarina possui estrutura frágil e incompleta na institucionalização dos seus processos de planejamento urbano. Há pouca pesquisa e o planejamento é limitado, enquanto, da mesma forma se fragilizaram as relações da sociedade civil com o poder publico, no indispensável debate das questões comunitárias, fator essencial para o exercício eficaz da cidadania. No presente, o que se constata é um vácuo nestas relações, a dispersão de forças ou sua antagonização, em disputas localizadas, sempre em detrimento de uma cultura voltada ao bem publico, à solidariedade comunitária e a eficiência na aplicação de recursos.”
Belas e feias, antigas ou recentes, as cidades estão virando lixo, sucateadas pela paralisia dos serviços públicos e dominadas por quadrilhas do jogo político, reconhecidas e legalizadas à luz de aparelhos institucionais.
Apolinario Ternes
14 de março de 2009
A Cidade Submersa é o titulo do texto que o Jornal A Noticia publica no domingo dia 15 de março. Com a clareza de sempre, Apolinario Ternes coloca o dedo na ferida. Vale a pena ler. Um alerta sobre como a freqüência e a gravidade das enchentes que acidade vive, tem responsáveis sim. O descaso, a irresponsabilidade e a incompetência de administrações recentes. Que a sociedade e principalmente a administração atual possam aprender e não cometer os mesmos erros é importante para Joinville.
O texto publicado pelo Cacau Menezes no dia 3 de Dezembro de 2008. | N° 8275, que transcrevemos a seguir em azul, despertou uma interessante troca de comentários e opiniões.
É impressionante, como dia a dia, este blog ganha consistência com a contribuição dos seus leitores, copio em azul, como sempre, a troca de textos e de opiniões.
Como tudo começa
Você quer saber como começa uma tragédia? É simples: autoridades, às vezes dos três poderes, permitem que se avance sobre a natureza, destruindo áreas que deveriam ser preservadas e que, no futuro, podem causar sérios problemas aos moradores que se instalarem no local. Muita gente ganha dinheiro e deixa o problema para quem se instala. Problema que só vai eclodir 10, 15 anos depois, quando ninguém mais vai lembrar quem começou tudo isso.
Neste exato momento, quando ainda se computam mortos e perdas do desastre ambiental em solo catarinense, o governo do Estado apresentou à Assembléia Legislativa o Projeto de Lei 347/08 para desanexar áreas do Parque Estadual da Serra do Tabuleiro, uma área da Mata Atlântica. O projeto tramita em caráter de urgência. Basicamente, propõe desanexar áreas da região costeira criando "Áreas de Preservação Ambiental" sob gestão das prefeituras, altamente manipuláveis pelo setor imobiliário. O Parque da Serra do Tabuleiro é fundamental, também, para o abastecimento de água da Grande Florianópolis.
Cabe à sociedade catarinense conversar com os seus deputados sobre o que deseja para o futuro do nosso Estado. Mais área verde ou mais tragédias.
O Arquiteto Arno Kumlehn escreveu esta resposta
COMO TUDO COMEÇA mal, termina...
Infelizmente grande parte das responsabilidades pela tragédia ocorrida em terras catarinenses (hoje e com certeza as do futuro) pode ser creditada como mencionado aos três poderes, porém não podemos esquecer de creditar ou estabelecer um percentual de culpa também à sociedade civil.
O solo urbano ou rural fica a mercê de interesses, onde normalmente os encastelados são gerentes de um grande balcão de negócios, como você mencionou.
Hoje tramitam na maioria das cidades brasileiras processos de “apagar das luzes”, propostos pelos executivos e legislativos municipais onde na maioria das vezes atendem interesses de apadrinhados ou financiadores da vida pessoal do homem publico ou de campanhas.
A sociedade civil deveria estar mais bem informada sobre os instrumentos de política urbana e o judiciário mais atento às movimentações que ocorrem sobre o tema.
A lei federal 10.257(Estatuto das Cidades) no seu artigo segundo diz: “a política urbana tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade... garantindo a cidade sustentável... de modo a evitar e corrigir as distorções do crescimento urbano e seus efeitos negativos sobre o meio ambiente”.
A mesma lei obrigou todas as cidades a estabelecerem seus novos PLANOS DIRETORES, e estabeleceu dois novos itens importantes para a política urbana: gestão de democrática da cidade e estudo de impacto de vizinhança.
A lei é de 2001, portanto eu pergunto:
1. Qual das grandes cidades do estado já aprovou na integra o plano diretor e todas as suas leis complementares?
2. Qual grande cidade do estado já realizou a Conferencia da Cidade para eleger e, portanto formar o seu Conselho da Cidade?
3. Em que cidade catarinense foi discutido e aprovado um ESTUDO DE IMPACTO DE VIZINHANÇA quando da alteração de legislação ou implantação de um projeto que altere representativamente (um shopping, um loteamento, um corredor de ônibus) a paisagem urbana? Quando digo aprovado é por ser necessário a apresentação de medidas mitigadoras.
Enquanto a palavra DESENVOVER basear o planejamento urbano, continuaremos no futuro a pagar contas cada vez mais caras. Acredito que devemos mudar o verbo para PROSPERAR.
Hoje depois do brilhante texto do Apolinário ganhou ainda este PS, e acrescenta ainda referencias a entrevista do prefeito Marco Tebaldi, ou por sofrer um momentâneo ataque de amnésia ou por não querer se vangloriar da sua participação, esquece a forte contribuição que ao longo dos últimos anos, e foram muitos, teve como secretario da habitação, como vereador e como prefeito, na aprovação e consolidação da maioria de absurdos que foram feitos nestes mais de 20 anos.
O que o prefeito pode querer dizer, é que hoje, pela ação forte da sociedade organizada, do Ministério Publico e principalmente pelo maior acesso que a sociedade tem para defender suas opiniões...estes absurdos não seriam aprovados, pode ser que o prefeito tenha razão e tenha esquecido de destacar o porque não seriam aprovados.
O que é verdade e que não tem sido o aumento da honestidade, nem da seriedade e muito menos da competência nas nossas prefeituras, nem nas nossas câmaras de vereadores e muito menos nas nossas estruturas publicas de planejamento urbano as que Apolinario faz referencia no seu texto.
PS: Para complementar, boa leitura é AN geral/15 onde o Arq. Gilberto Lessa leia-se IPPUJ diz “que ainda não esta nada definido”, ou que a “construção de prédios pode ocorrer”. Ai o texto do Apolinário é cirúrgico: “em estruturas sofríveis de planejamento urbano... abarrotados de servidores. Necessitam de sopro de competência...” (eu diria de competências). Como também o nosso atual Burgomestre afirma: “Hoje, eles não seriam aprovados”. Bela afirmação para quem participou ou patrocinou nos últimos 12 anos das alterações da lei 27/96 a bem do dito do desenvolvimento. Para finalizar, o nosso governador em Rio Violento conta estórias e finaliza dizendo que a terra produz coisas da melhor qualidade. Esquece o governador que a melhor qualidade de sua terra é sua gente, que no momento não precisa de histórias e sim de ações. Por sinal essa gente tem muitas histórias tristes para escrever, escrita com tinta e papel em parte fornecidos pelos seus governantes.
Como diz meu amigo Mandelli, sobre o desenvolvimento :não precisamos desenvolver, precisamos PROSPERAR (do livro: Gestão da Mudança) e sobre as COISAS, existem dois tipos de pessoas: as pessoas que gostam de coisas, e as pessoas que gostam de pessoas (do livro: Muito Além da Hierarquia). Acho que não temos mais duvidas sobre as escolhas de nossos governantes...
Em consideração às vítimas, aos quase seis milhões de catarinenses e ao País, cansado e sofrido de assistir a tanta tragédia, destruição e dor, não se deveria escolher o tema de todas as pautas para cair na repetição do mesmo. Pelas mesmas razões, imperativamente, se torna obrigatório o retorno.
Não se trata de buscar culpados ou apontar responsáveis, mas de buscar causas e tentar, ainda, reduzir os efeitos da repetição, pois ela virá, amanhã ou depois. Como agora, 25 anos depois de 1983, em mais dramática circunstância, cobrando preço maior. A enchente na cidade de Tubarão, em março de 1974, com 199 mortos, e as históricas enchentes do Vale do Itajaí em 1983 e 1984 se repetiram em novembro de 2008 em razão de efeitos combinados da natureza. Assim como os acidentes de avião precisam muitas vezes de fatores somados para determinar uma tragédia, também agora várias foram as combinações que explicam o tumulto das águas e o desassossego das terras. Tivemos novo espetáculo da dupla revolta da natureza, diante da vulnerabilidade humana mostrada em sua absoluta fragilidade.
As amargas experiências anteriores pouco serviram para os homens daqui. O poder público continua, como sempre e não apenas aqui, absolutamente ineficiente, ausente, omisso. De um lado, a população se instala onde não deve e não pode, mas o faz premida pela necessidade. De outro, o poder público, que tanto fala, tanto encena, tanto gesticula, nessas horas mostra sua inoperância e inutilidade. Um duplo castigo – a população imprudente e governos impudentes, um caso duplo de consciência mínima.
A tragédia de nossos dias, repetição de outras em menor escala de tantos outros anos, tende a se repetir. E teremos de novo o vôo de helicóptero de cinco minutos de deus-pai, com acólitos e áulicos, anunciando verbas iluminadas que jamais serão liberadas. Eles podem anunciar tudo, porque não há critério de cobrança, e tudo ficará no porão da burocracia, envolto no papel da não-seriedade, de uma nação especializada em premiar a inconseqüência do poder. E quanto maior o poder, maior a desfaçatez. Quem acredita, afinal, nesses rosários de providências, nesses milhões fáceis que as vozes burocráticas vomitam, nesse rosário de siglas, números e programas oficiais de benefícios, financiamentos e prorrogações? O flagelado que perdeu tudo prorroga o quê? O prazo de seu martírio? Onde? Fala com quem?
O que funcionou na tragédia? A Defesa Civil, em precárias condições na maioria das cidades. Em Joinville, os dois veículos do órgão estavam com problemas no início das inundações, revelou a imprensa. Não houve qualquer aviso para que as populações se retirassem dos locais de risco. Nada do planejado funcionou em todo o Estado, apesar das sucessivas tragédias. Funcionaram, exemplarmente, as Forças Armadas, os bombeiros, e todos os voluntários. E a solidariedade, comovente, dos catarinenses, e do todo o País. Enquanto por aqui circulavam pelas estações de tevê políticos cheios de palavras e destituídos de ação.
A tragédia é grande, e podia ter sido evitada, pois Santa Catarina já tem experiência, mas nada fez. Pelo contrário, continua devastando a mata atlântica. Não possui legislação ambiental adequada e, agora mesmo, cuida de aprovar um texto inadequado para a área. As prefeituras, mesmo de cidades grandes como Joinville e Blumenau, Jaraguá ou São Bento, para não falar da Capital do Estado, têm estruturas sofríveis de planejamento urbano e cuidam do trânsito sem técnicos e sem especialistas, e, assim mesmo, estão abarrotadas de servidores. Necessitam de sopro de competência, mas vivem apenas do jeitinho político.
Verbas milionárias foram anunciadas. O Estado deveria criar mecanismos para garantir a aplicação dos recursos – para que não fiquem na retórica, como sempre. A sociedade civil deveria organizar comitês para cobrar transparência na aplicação dos recursos. Onde está a sociedade civil? A solidariedade é bonita, mas não basta, é preciso organização. O que Santa Catarina não teve antes. Apesar das experiências amargas que acumula.
O texto publicado no jornal A Noticia, no domingo dia 7 de Dezembro, coloca com muita propriedade e com a elegância que lhe é caracteristica, muitos dos pontos de vista que este blog e a maioria dos seus leitores tem abordado durante estas semanas de dor e tristeza.Os destaques em negrito no texto são nossos.
Publica no Jornal A noticia de Joinville no dia 23 de maio este texto, brilhante como sempre, porem neste caso especialmente importante. Força ao leitor a uma reflexão profunda sobre o futuro desta cidade. Postamos o texto na integra.
Para complementar os esboços da semana passada sobre possibilidades e expectativas em torno do futuro, cabem referências e comentários no âmbito menor, da realidade local. Não sobre o Brasil, em temporada de acasalamento com o "futuro" - como nunca antes na história deste País - , mas sobre Joinville, a ex-colônia Dona Francisca, outrora conhecida como Cidade das Flores.
O futuro de Joinville, sabem os que aqui vivem e trabalham, é razoável. Basta conferir as transformações vividas pela cidade nos últimos anos. Nascida para ser agrícola, em 1851, conforme planos de seu fundador, a colônia se transformou em cidade industrial, após breve período como entreposto comercial, na virada do século 19 para o 20.
Acompanhando os ciclos da economia brasileira, por sua vez a reboque da economia mundial, Joinville acabou na linha de frente do processo industrial. Foi assim até o final da década passada, na outra virada de século e milênio. Dali em diante, ensaia mudanças. Elas acontecem, puxadas mais por discursos do que por atos e fatos. Por algum tempo, sempre será possível manter as aparências. Depois, se exige profissionalização e é preciso mostrar resultados. Joinville está na última fase, a dos resultados. Que são poucos, como se constata em todos os lugares: na educação, na saúde, na infra-estrutura, na cultura, no turismo e no meio ambiente.
O futuro imediato não é difícil vislumbrar. Serviços, educação, saúde e turismo deverão movimentar a economia, ainda que a base industrial continue isso mesmo, a base. A prova disso é que a GM anuncia sua fábrica de motores, e o discurso oficial é de entusiasmo, com incentivos generosos. No século 21 e em economias competitivas, a GM pediria licença e cumpriria um caderno de exigências. Trata-se de um tipo de indústria do século passado. Desinteressante, poluidora e geradora de (poucos) empregos, antigos. No entanto, aqui, para o poder público...
Hoje, Joinville tem pouco a aplaudir. Apesar da retórica disso e daquilo, temos recordes de homicídios, situação crítica na saúde, trânsito congestionado, rios poluídos, terceiro turno na educação, escolas interditadas e não temos um só quilômetro para uma caminhada segura. A cidade bonita e campeã existe apenas no discurso político, não na vida real do cidadão. Estamos saindo de um tempo de marketing exaustivo para outro, talvez longo, da mesma coisa.
Em 2015, ou daqui a sete anos, teremos, então, duas ou três salas de aula no "campus" da UFSC na Curva do Arroz. Ou alguém acredita que teremos aulas ali em 2009, como prometido? Até 2015, teremos um ou dois dos dez parques que hoje existem apenas no papel. Até 2015, a Cidadela da Cultura estará reformada, com paredes reconstruídas e pintadas. Antes de 2015 - vale o otimismo - , a biblioteca pública terá verba para atualizar o acervo, a estação ferroviária, enfim, restaurada, terá alguma destinação cultural.
As ciclovias, em 2015, permitirão que joinvilenses se desloquem entre um e outro bairro, bem como o acesso ao mirante - com restaurante no topo, de que se fala desde a década de 1980 - atenderá aos locais e visitantes. As festas de outubro, em 2015, retornarão ao calendário. A Festa das Flores será reestruturada, o Festival de Dança e a Escola Bolshoi continuarão rendendo dividendos. Até 2015, as calçadas do centro serão recuperadas, aposte nisso.
Em Joinville, o maior partido político do País e que detém o governo do Estado, está importando candidato para a eleição de outubro. O que comanda a Prefeitura não tem candidato. Como explicar tais paradoxos? Desgaste de marketing?
Joinville continuará mais fabril do que turística. Mesmo com o setor de serviços continuando a crescer, a economia terá na indústria o seu fundamento. A educação não crescerá tanto quanto cresceu na última década, e o setor da gastronomia terá de se profissionalizar ainda mais. O setor público precisa superar o desafio da burocracia, do nepotismo cruzado, da ineficiência e do planejamento zero. Isso depende da política e, em política, não é o Brasil que está atrasado, é o mundo que anda para trás. Vejam a França de Sarkozy, os Estados Unidos de Bush e a Rússia de Putin.
Joinville tem muito pouco a comemorar. Hoje e amanhã. É melhor pular para 2015. E mesmo lá, não conte com o rio Cachoeira despoluído.
O Historiador e Jornalista Apolinario Ternes, que escreve no Jornal A Noticia, publicou este texto. Não preciso acrescentar nenhum comentario, o texto é brilhante e merece ser compartilhado. A ponte da insensatez,
Quando a obra foi iniciada, há 70 dias, ninguém imaginou que teria continuidade. Em poucos dias seria interrompida até que plano melhor fosse aplicado, em nome da competência e do respeito aos catarinenses. Nada disso aconteceu. A obra continuou, e os engarrafamentos também. E perduram até hoje, para espanto de todos. Refiro-me à recuperação da ponte sobre o rio Itajaí-açu, em Navegantes, na BR-101, obra de responsabilidade do governo federal, por meio do Departamento Nacional de Infra-estrutura de Transportes (DNIT).
Da noite para o dia, desviou-se o tráfego de uma das rodovias de maior trânsito no Sul do País, em plena temporada de verão, e alguém colocou meia dúzia de operários a fazer obra capaz de produzir prejuízo incalculável a milhares de pessoas. Sem explicação e sem satisfação de ninguém. Engarrafamento contínuo de três a quatro quilômetros se formou na meia pista, obrigando milhares de pessoas a aguardar prazo médio de uma hora para a travessia do pequeno trecho. Semanas depois, a mídia noticiou pequena reação de algumas entidades e informou que o turno de trabalho seria ampliado e equipes, reforçadas. Anunciou-se, então, que o prazo de entrega da obra seria antecipado em 15 dias. Brutal decepção. Nada de agilidade, eficiência, turnos intermediários, explicações e alguma satisfação à sociedade. Nada!
Um burocrata sem nome, em nome do Estado, nomeado por alguém junto ao "núcleo" do poder, no quartel-general do Estado, decide num gabinete refrigerado do DNIT que é preciso (e de fato era) consertar a ponte, e ponto final. Há 70 dias, milhares de catarinenses, debaixo do sol e da chuva, à luz do dia ou no sereno da noite, aguardam pacientemente uma hora ou mais a travessia da ponte de Navegantes. Não precisava ser assim, mas assim tem sido. Nos Estados Unidos ou na Europa, obras dessa natureza são feitas em ritmo acelerado, em processo contínuo, em poucos dias. Muitas vezes, à noite. Aqui não. Ali, você passa e vê com os próprios olhos: um operário trabalha e outro contempla! Um trabalha e outro fiscaliza! Deve ser tecnologia de última geração, que só funciona se tiver olho humano assistindo. A morosidade do conserto da ponte prova por que o PAC não sai do papel em lugar nenhum. Só existe na retórica do Lula e na estatística de mãe Dilma.
Decorridos 70 dias, quanto foi o prejuízo dado aos catarinenses? Em reais, qual o prejuízo das empresas de transportes? Da indústria? Do comércio? Do turismo? Quanto não deixou de arrecadar o Estado de Santa Catarina? (Com Beto Carrero e Camboriú ao lado). E, mesmo assim, não se viu um pronunciamento das autoridades. Não há uma Secretaria de Infra-estrutura? Não há um Departamento de Infra-estrutura? Sim, a obra é federal, mas o prejuízo é estadual! E a Federação das Indústrias do Estado e a Federação do Comércio se manifestaram? A Prefeitura de Itajaí, com o porto ali do lado? E a de Navegantes, do outro? O Ministério Público fez alguma coisa? A mídia, além de matérias de 20 linhas, gritou sobre a barbaridade que vem sendo cometida há mais de 70 dias contra os interesses e a dignidade dos catarinenses? O que espanta nesse episódio são o comodismo e a resignação da opinião pública. O comodismo diante da desfaçatez de um servidor público anônimo capaz de provocar tamanho prejuízo sem que uma única voz se levante ou uma única autoridade se faça ouvir.
Temos 40 deputados estaduais que ganham salários maravilhosos. Habitam um palácio cheio de assessores, rodam em veículos modernos e gastam fábulas em celulares dia e noite. Pois nenhum se interessou em resolver o caso da ponte. Temos 16 deputados federais que ganham melhor ainda. Gastam mais ainda. Têm o dobro de assessores e embarcam e desembarcam em Navegantes o tempo todo. Não se tem notícia de que algum se interessou pelos transtornos do conserto da ponte. Temos três senadores, nenhum demonstrou o menor interesse pelo assunto. Eles vão responder que não, já sabemos disso. Mas se se interessaram, aqui vai a resposta: foram incompetentes no que fizeram, pois as obras continuam a passo de tartaruga. Para decepção de seus eleitores.
O caso é emblemático: não se trata apenas de um episódio que lembra Franz Kafka, o autor tcheco que revelou o terror do Estado moderno, mas, principalmente, de lembrar outro alemão, Brecht, que dizia assim: "Primeiro, levaram os negros. Mas não me importei com isso. Eu não era negro. Em seguida, levaram alguns operários. Não me importei com isso. Eu não era operário. Depois, prenderam os miseráveis. Em seguida me levaram... e não tinha ninguém para protestar!"