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25 de janeiro de 2009

Mais livros nos fazem mais livres


O Jornal Folha de São Paulo, traz no seu caderno Mais um texto interessante de Renato Mezan que vale a pena ler, para os nossos leitores reproduzimos aqui na integra.

Não lê por quê?

Desdém do presidente pela leitura, que não se justifica pelas origens humildes, presta um desserviço ao Brasil


Uma frase dita pelo presidente Lula em sua entrevista à revista "Piauí" deste mês vem dando o que falar: não é por falta de tempo que não lê blogs, sites, jornais ou revistas, mas porque tem "problema de azia". A observação provocou reações de jornalistas e colunistas, e é provável que tenha causado mal-estar na comunidade acadêmica, assim como entre os brasileiros com maior nível cultural. Nenhuma ideia pode ser examinada sem referência ao seu contexto. O presidente não estava falando das virtudes ou malefícios da leitura em geral, mas apenas do efeito que tem sobre ele o noticiário, em especial o político; assim, seria descabido inferir do que disse uma suposta opinião negativa da sua parte sobre o ato ou o costume de ler. Contudo, nos parágrafos seguintes à declaração -que também delimitam o contexto dela-, fala do seu lazer: ora, se deste fazem parte "pescar, jogar cartas, conversar", brilha pela ausência qualquer menção à leitura de livros e, igualmente, a qualquer outra atividade cultural.

Dirá o leitor que isso se deve à sua origem humilde? Além de ser uma generalização indevida, tal explicação deixa de lado o fato de que muitas pessoas nada abonadas frequentam shows, veem filmes de apelo popular, visitam exposições divulgadas pela mídia ou vão ouvir música erudita, quando essas coisas são oferecidas a preços que cabem no seu bolso ou mesmo gratuitamente. Horas na fila Que o diga quem esperou horas para entrar na exposição de Rodin, espremeu-se nas filas de "Dois Filhos de Francisco" e "Tropa de Elite" ou se dispõe a enfrentar a multidão que acorre ao parque Ibirapuera para ouvir as orquestras estrangeiras que de vez em quando se apresentam no parque. Atenhamo-nos, porém, ao capítulo livros.

É certo que alguém pode se informar pela televisão ou por resumos preparados por assessores sobre assuntos de interesse dos seus chefes -metade da matéria da revista é dedicada a Clara Ant, que faz esse trabalho para o presidente. Mas nem briefings nem meios eletrônicos podem substituir o livro, e isso por ao menos duas razões. A primeira é que ver imagens ou ouvir alguém falando põe em jogo capacidades psíquicas diferentes das requeridas para lidar com um texto longo.
Além de concentração muito maior, a extensão de um livro comum torna impossível apreender seu conteúdo de uma única vez.

O hábito de ler favorece portanto a retenção de dados e treina a memória para reconhecer e acessar, entre seus inúmeros arquivos, aqueles que permitem estabelecer continuidade entre o que se leu antes e o que se está lendo agora. A segunda é que, como contém num volume reduzido um enorme número de informações, o livro possibilita, no trato dos seus temas, uma abrangência que nenhum artigo ou vídeo pode igualar. É o espaço do debate entre ideias complexas, do relato minucioso, da descrição precisa do que o autor julga importante comunicar. Isso permite o trânsito entre níveis diferentes de abstração, entre o detalhe e o quadro do qual faz parte, entre os elementos isolados e a síntese que lhes dá sentido.

Um mau modelo mas não é por essas qualidades dos livros que lamento a ausência deles no cotidiano de Lula. É porque, com a influência que têm suas palavras e atitudes, o fato de não demonstrar o menor interesse pela palavra impressa transmite uma mensagem nefasta a quem nele confia e nele se espelha. Todos sabem que é um excelente comunicador: se insistisse na importância dos livros, se utilizasse em suas falas exemplos e referências tirados do que leu, podemos estar certos de que isso teria efeito benéfico sobre os milhões de brasileiros que passam anos, ou a vida inteira, sem jamais segurar nas mãos um volume, quanto mais abri-lo e se inteirar do que ele contém.

O presidente já disse muitas vezes que não ter estudado não o impediu de chegar aonde chegou. Eis outra frase infeliz: não é porque teve parca instrução formal, mas apesar dessa falta, que obteve seus sucessos. Ao mencioná-la como se fosse algo positivo, contribui -mesmo que não seja essa a sua intenção- para desprestigiar ainda mais tudo o que está ligado à educação. A situação calamitosa do ensino no Brasil em nada melhora quando o modelo identificatório que o presidente Lula representa para tanta gente sugere nas entrelinhas que estudar não é necessário.
Essa atitude blasée, ao contrário, me parece particularmente perniciosa para os jovens, muitos dos quais, por razões que não cabe aqui explicitar, têm atualmente pela leitura uma aversão que beira a fobia.

O que está em jogo aqui não é a visão utilitária segundo a qual o estudo é o caminho da ascensão social, mas a importância dele (e da leitura) para criar cidadãos menos permeáveis à manipulação pelos órgãos de informação, da qual o próprio presidente se queixa na entrevista.
Diz Lula que é admirador de Barack Obama e crítico contundente de George W. Bush. No entanto o descaso com os livros e com o que eles significam o aproxima deste, e não daquele. Uma das pérolas proferidas pelo texano foi endereçada aos estudantes da universidade em que se formou (Yale) e na qual teve desempenho medíocre: "Vocês, alunos que tiram C, também podem pretender ser presidentes dos EUA". Em contraste, Obama -que em seus tempos de Harvard dirigiu a revista da Faculdade de Direito- tem o maior respeito pelos livros, graças aos quais pôde adquirir uma sólida base intelectual para suas convicções progressistas.

Só carisma não resolve Sem a frequentação deles, não teria podido citar em seu discurso de posse a Bíblia e palavras de George Washington, não saberia se servir das alusões e metáforas que abrilhantaram sua fala nem demonstraria o seguro conhecimento da história do seu país, assim como da situação de povos estrangeiros, que evidentemente possui. É certo que sem seu carisma e sem a habilidade retórica que soube desenvolver nada disso teria produzido o entusiasmo que se viu, mas também seria tolo negar que a qualidade literária e a construção caprichada do discurso têm algo a ver com o efeito que teve mundo afora. E não se objete que foi redigido por assessores: no dia seguinte, os jornais davam conta de que foi o próprio Obama quem estabeleceu o roteiro básico e deu ao texto a última demão de tinta. Lula não é o tabaréu que alguns pretendem (o jornalista Mario Sergio Conti, a quem ele concedeu a entrevista, diz que o site da revista "Veja" na internet o mima frequentemente com o epíteto de apedeuta, que significa ignorante).
Mas é certo que, se tivesse um pouco mais de apreço pela letra de forma, evitaria meter-se em algumas situações constrangedoras e faria um grande bem ao povo "deste país".


RENATO MEZAN é psicanalista e professor titular da Pontifícia Universidade Católica de SP. Escreve na seção "Autores", do Mais! .

19 de janeiro de 2009

Adão Iturrusgarai

Você não se sente também assim, as vezes?

Do cartunista Adão Iturrusgarai - Mundo Monstro, na Folha de São Paulo de 29 Dez 2008

1 de dezembro de 2008

Irresponsabilidade mata




Irresponsabilidade mata

SÃO PAULO - "As pessoas precisam morar." A declaração é do coordenador da Defesa Civil de Santa Catarina, major Márcio Luiz Alves, e foi proferida (ou cuspida) após ser questionado pelo repórter Evandro Spinelli sobre as ocupações irregulares no Estado e a falta de fiscalização.
A causa da tragédia catarinense não é a chuva, mas a irresponsabilidade de quem permitiu que milhares de pessoas vivessem em locais perigosos, nas encostas dos morros ou nas várzeas dos rios. A maioria dos mortos não foi vítima da água, mas, sim, da terra ou do tijolo que caiu sobre suas cabeças.
Era obrigação do poder público mapear as áreas de risco, combater o desmatamento nos morros, fazer obras de prevenção onde isso era possível ou simplesmente impedir a ocupação onde não era.
Nada foi feito, apesar dos "avisos" freqüentes: só na cidade de Blumenau foram 32 inundações em 24 anos (1980-2004).
Como já dizia Joelmir Beting na Folha, em 1983, ao tratar em sua coluna do impacto econômico das enchentes no Sul, a "natureza não se defende, apenas se vinga".
Rio enche em Itajaí, em Paris ou na China. Sempre foi assim, sempre será. Inundação ocorre quando o homem ocupa o reservatório natural da cheia. Como em São Paulo, cidade que teve a brilhante idéia de construir seu mais importante sistema viário -as marginais- na beira dos rios Tietê e Pinheiros.
O próprio coordenador da Defesa Civil catarinense não nega que a ocupação irregular ajudou a potencializar riscos e que houve falha de fiscalização. "Qualquer um sabe que não pode ocupar as áreas, que tem de tirar a população", afirma.
Apesar disso, no que deveria ser considerado como seu pedido de demissão, completou: "Quero ver quem é que vai fazer". Major, é isso mesmo, alguém tem de fazer.

ROGÉRIO GENTILE - FSP

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