O Historiador e Jornalista Apolinario Ternes, que escreve no Jornal A Noticia, publicou este texto. Não preciso acrescentar nenhum comentario, o texto é brilhante e merece ser compartilhado.
A ponte da insensatez,
Quando a obra foi iniciada, há 70 dias, ninguém imaginou que teria continuidade. Em poucos dias seria interrompida até que plano melhor fosse aplicado, em nome da competência e do respeito aos catarinenses. Nada disso aconteceu. A obra continuou, e os engarrafamentos também. E perduram até hoje, para espanto de todos. Refiro-me à recuperação da ponte sobre o rio Itajaí-açu, em Navegantes, na BR-101, obra de responsabilidade do governo federal, por meio do Departamento Nacional de Infra-estrutura de Transportes (DNIT).
Da noite para o dia, desviou-se o tráfego de uma das rodovias de maior trânsito no Sul do País, em plena temporada de verão, e alguém colocou meia dúzia de operários a fazer obra capaz de produzir prejuízo incalculável a milhares de pessoas. Sem explicação e sem satisfação de ninguém. Engarrafamento contínuo de três a quatro quilômetros se formou na meia pista, obrigando milhares de pessoas a aguardar prazo médio de uma hora para a travessia do pequeno trecho. Semanas depois, a mídia noticiou pequena reação de algumas entidades e informou que o turno de trabalho seria ampliado e equipes, reforçadas. Anunciou-se, então, que o prazo de entrega da obra seria antecipado em 15 dias. Brutal decepção. Nada de agilidade, eficiência, turnos intermediários, explicações e alguma satisfação à sociedade. Nada!
Um burocrata sem nome, em nome do Estado, nomeado por alguém junto ao "núcleo" do poder, no quartel-general do Estado, decide num gabinete refrigerado do DNIT que é preciso (e de fato era) consertar a ponte, e ponto final. Há 70 dias, milhares de catarinenses, debaixo do sol e da chuva, à luz do dia ou no sereno da noite, aguardam pacientemente uma hora ou mais a travessia da ponte de Navegantes. Não precisava ser assim, mas assim tem sido. Nos Estados Unidos ou na Europa, obras dessa natureza são feitas em ritmo acelerado, em processo contínuo, em poucos dias. Muitas vezes, à noite. Aqui não. Ali, você passa e vê com os próprios olhos: um operário trabalha e outro contempla! Um trabalha e outro fiscaliza! Deve ser tecnologia de última geração, que só funciona se tiver olho humano assistindo. A morosidade do conserto da ponte prova por que o PAC não sai do papel em lugar nenhum. Só existe na retórica do Lula e na estatística de mãe Dilma.
Decorridos 70 dias, quanto foi o prejuízo dado aos catarinenses? Em reais, qual o prejuízo das empresas de transportes? Da indústria? Do comércio? Do turismo? Quanto não deixou de arrecadar o Estado de Santa Catarina? (Com Beto Carrero e Camboriú ao lado). E, mesmo assim, não se viu um pronunciamento das autoridades. Não há uma Secretaria de Infra-estrutura? Não há um Departamento de Infra-estrutura? Sim, a obra é federal, mas o prejuízo é estadual! E a Federação das Indústrias do Estado e a Federação do Comércio se manifestaram? A Prefeitura de Itajaí, com o porto ali do lado? E a de Navegantes, do outro? O Ministério Público fez alguma coisa? A mídia, além de matérias de 20 linhas, gritou sobre a barbaridade que vem sendo cometida há mais de 70 dias contra os interesses e a dignidade dos catarinenses? O que espanta nesse episódio são o comodismo e a resignação da opinião pública. O comodismo diante da desfaçatez de um servidor público anônimo capaz de provocar tamanho prejuízo sem que uma única voz se levante ou uma única autoridade se faça ouvir.
Temos 40 deputados estaduais que ganham salários maravilhosos. Habitam um palácio cheio de assessores, rodam em veículos modernos e gastam fábulas em celulares dia e noite. Pois nenhum se interessou em resolver o caso da ponte. Temos 16 deputados federais que ganham melhor ainda. Gastam mais ainda. Têm o dobro de assessores e embarcam e desembarcam em Navegantes o tempo todo. Não se tem notícia de que algum se interessou pelos transtornos do conserto da ponte. Temos três senadores, nenhum demonstrou o menor interesse pelo assunto. Eles vão responder que não, já sabemos disso. Mas se se interessaram, aqui vai a resposta: foram incompetentes no que fizeram, pois as obras continuam a passo de tartaruga. Para decepção de seus eleitores.
O caso é emblemático: não se trata apenas de um episódio que lembra Franz Kafka, o autor tcheco que revelou o terror do Estado moderno, mas, principalmente, de lembrar outro alemão, Brecht, que dizia assim: "Primeiro, levaram os negros. Mas não me importei com isso. Eu não era negro. Em seguida, levaram alguns operários. Não me importei com isso. Eu não era operário. Depois, prenderam os miseráveis. Em seguida me levaram... e não tinha ninguém para protestar!"
( aternes@terra.com.br )
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