9 de junho de 2008

Joinville é bom demais?

A cada dia que passa o jornal A Noticia, ganha novos e melhores articulistas, pessoas que sem deixar de amar Joinville, tem a clareza de enxergar, por debaixo de oficialismo da imprensa oficial, uma outra cidade mais perto da real, da Joinville do nosso dia a dia.
Sem que se possa enxergar nestes comentarios e nestas opiniões uma visão catastrofica ou negativista, é possivel acreditar que uma outra Joinville é possivel e que cada vez uma parcela maior da população compartilha esta visão.

O texto brilhante de Valdete Daufemback, merece ser lido com carinho e compartilhado. Foi publicado no Jornal A Noticia no dia 28 de Maio de 2008.


Joinville esbanja predicados na construção de sua imagem publicitária e, utilizando-se da estratégia de seleção e omissão de espaços e ângulos sociais, sempre tentou se diferenciar das demais cidades do Estado. Na década de 1970, disputava com Blumenau o lugar de melhor município de Santa Catarina. A descendência germânica, a arquitetura, os clubes de tiro, as festas, as emissoras de rádio e televisão compreendiam características que movimentavam a concorrência das duas "cidades irmãs". Até mesmo o futebol foi um ícone de competição. Da união do América e do Caxias nasceu o "time forte", o Joinville Esporte Clube, que não parava de acumular vitórias sobre os times menos estruturados, enchendo de orgulho a população joinvilense.

Este feito "espetacular" coincidiu com o período de crescimento industrial capitaneado pelos governos militares. Era a política do Estado de bem-estar social atuando por meio da idéia da conciliação entre capital e trabalho. Trabalhar em uma grande indústria era o sonho de milhares de operários, pois, além do salário, o trabalhador e sua família poderiam usufruir da infra-estrutura da empresa, como a cooperativa de consumo e a associação esportiva e recreativa.

Mas as recreativas das empresas, além de proporcionar às famílias dos trabalhadores o bem-estar, cumpriam o papel de reunir os operários em um ambiente fora do expediente de trabalho, resguardando-os da presença e influência dos sindicatos. Nesse sentido, a recreativa cumpria uma função disciplinadora. Assim, o trabalho e o lazer estavam disponibilizados no mesmo lugar, para o conforto e a segurança de todos. Desta forma, a predominância do lazer privado impulsionava os trabalhadores ao desejo de pertencer às empresas que oferecessem espaço para praticar esportes no tempo livre.

A política neoliberal pôs em curso novas categorias de valores fundados em critérios econômicos de representação global. A reestruturação do capital e a incorporação de novas tecnologias caracterizaram a emergência na configuração de produtividade nas empresas. As demissões em massa e a presença da terceirização mudaram a concepção nas relações de trabalho. Nesse contexto, também a utilização das recreativas foi reinventada, passando de uso restrito aos trabalhadores e familiares à função terceirizada, com a abertura ao público em geral.

Afora as recreativas, restavam poucas opções de espaços de lazer. O parque infantil situado ao lado do Ginásio de Esporte Abel Schulz, no centro da cidade, depois que se transformou em "obra de arte", virou um lugar pouco reconhecido pela população. As praças no centro da cidade, depois que foram revitalizadas, tornaram-se lugares áridos. As árvores e o gramado com seus caminhos tortuosos foram substituídos por pedras expostas ao sol, refletindo calor, por onde as pessoas mais transitam do que se socializam. Sem contar que essas praças não são públicas, pois se alguém quiser ocupá-las para alguma atividade precisa de uma licença da Conurb. Nos bairros, as praças foram praticamente esquecidas pelo poder público. Não há, portanto, em Joinville, muitas opções de lazer em espaços públicos. Lembrando que a partir da Constituição brasileira de 1988, o lazer é um direito de todo cidadão.

Até os anos de 1990, a população joinvilense conhecia dois parques públicos destinados ao lazer: o Parque Zoobotânico e o Parque Municipal Morro do Finder. No período do segundo mandato do governo Freitag (1992/1996), na lista de prioridades apontadas pela população nas reuniões do orçamento regionalizado, a construção de um espaço de lazer ficou em segundo lugar, perdendo apenas para a necessidade de saneamento básico. Para suprir essa carência, uma área privada foi passada ao setor público municipal para ser construído o Parque Caieira, no bairro Adhemar Garcia. No entanto, passados poucos anos da euforia de sua inauguração, o que foi feito do local? A população continua reivindicando uma área de lazer, como apontou a pesquisa realizada pelo Instituto de Planejamento Urbano de Joinville (Ippuj) para a elaboração do Plano Diretor de município. A reivindicação de um espaço de lazer assumiu o terceiro lugar na lista de prioridades, ficando atrás da saúde e da educação.

O município - que se orgulha de ter a cidade mais populosa do Estado, o maior pólo industrial, de ser o maior arrecadador de impostos - mostra a fragilidade com que trata seus cidadãos, embora anuncie que "Joinville é bom demais".

( vdaufen@terra.com.br )

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