Editorial do Estadão – 26.02.2014
Até mesmo o lusófono presidente da Comissão Europeia, José
Manuel Durão Barroso, deve ter tido sérias dificuldades para entender os dois
discursos da presidente Dilma Rousseff proferidos em Bruxelas a propósito da
cúpula União Europeia (UE)-Brasil. Não porque contivessem algum pensamento
profundo ou recorressem a termos técnicos, mas, sim, porque estavam repletos de
frases inacabadas, períodos incompreensíveis e ideias sem sentido.
Ao falar de improviso para plateias qualificadas, compostas
por dirigentes e empresários europeus e brasileiros, Dilma mostrou mais uma vez
todo o seu despreparo. Fosse ela uma funcionária de escalão inferior, teria
levado um pito de sua chefia por expor o País ao ridículo, mas o estrago seria
pequeno; como ela é a presidente, no entanto, o constrangimento é
institucional, pois Dilma é a representante de todos os brasileiros – e não
apenas daqueles que a bajulam e temem adverti-la sobre sua limitadíssima
oratória.
Logo na abertura do discurso na sede do Conselho da União
Europeia, Dilma disse que o Brasil tem interesse na pronta recuperação da
economia europeia, "haja vista a diversidade e a densidade dos laços
comerciais e de investimentos que existem entre os dois países" – reduzindo
a UE à categoria de "país".
Em seguida, para defender a Zona Franca de Manaus,
contestada pela UE, Dilma caprichou: "A Zona Franca de Manaus, ela está
numa região, ela é o centro dela (da Floresta Amazônica) porque é a capital da
Amazônia (...). Portanto, ela tem um objetivo, ela evita o desmatamento, que é
altamente lucrativo – derrubar árvores plantadas pela natureza é altamente
lucrativo (...)". Assim, graças a Dilma, os europeus ficaram sabendo
que Manaus é a capital da Amazônia, que a Zona Franca está lá para impedir o
desmatamento e que as árvores são "plantadas pela natureza".
Dilma continuou a falar da Amazônia e a cometer desatinos
gramaticais e atentados à lógica. "Eu quero destacar que, além de ser a
maior floresta tropical do mundo, a Floresta Amazônica, mas, além disso, ali
tem o maior volume de água doce do planeta, e também é uma região extremamente
atrativa do ponto de vista mineral. Por isso, preservá-la implica,
necessariamente, isso que o governo brasileiro gasta ali. O governo brasileiro
gasta um recurso bastante significativo ali, seja porque olhamos a importância
do que tiramos na Rio+20 de que era possível crescer, incluir, conservar e
proteger." É possível imaginar, diante de tal amontoado de palavras
desconexas, a aflição dos profissionais responsáveis pela tradução simultânea.
Ao falar da importância da relação do Brasil com a UE, Dilma
disse que "nós vemos como estratégica essa relação, até por isso fizemos a
parceria estratégica". Em entrevista coletiva no mesmo evento, a
presidente declarou que queria abordar os impasses para um acordo do Mercosul
com a UE "de uma forma mais filosófica" – e, numa frase que faria
Kant chorar, disse: "Eu tenho certeza que nós começamos desde 2000 a
buscar essa possibilidade de apresentarmos as propostas e fazermos um acordo
comercial".
Depois, em discurso a empresários, Dilma divagou, como se
grande pensadora fosse, misturando Monet e Montesquieu – isto é, alhos e
bugalhos. "Os homens não são virtuosos, ou seja, nós não podemos exigir da
humanidade a virtude, porque ela não é virtuosa, mas alguns homens e algumas
mulheres são, e por isso que as instituições têm que ser virtuosas. Se os
homens e as mulheres são falhos, as instituições, nós temos que construí-las da
melhor maneira possível, transformando... aliás isso é de um outro europeu,
Montesquieu. É de um outro europeu muito importante, junto com Monet."
Há muito mais – tanto, que este espaço não comporta. Movida
pela arrogância dos que acreditam ter mais a ensinar do que a aprender, Dilma
foi a Bruxelas disposta a dar as lições de moral típicas de seu padrinho, o
ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Acreditando ser uma estadista
congênita, a presidente julgou desnecessário preparar-se melhor para
representar de fato os interesses do Brasil e falou como se estivesse diante de
estudantes primários – um vexame para o País